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Agosto


Agosto

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Confess’a saudade
Desses tempos já idos,
Outrora esquecidos
Dessa tenra idade
,

Quando lá me sentia
Na aldeia da serra
Tomand’o gosto da terra
Na água que bebia,

Pura e cristalina
Que corria da fonte,
Nessa aldeia do monte
Envolt’a em neblina….

Nas manhãs d’Agosto
Qu’o sol dissipava,
À aldeia regressava
Este alegre rosto!

Pois por lá era eu
Em total liberdade,
E daí a saudade…
Dum tempo só meu!

Do cheir’a café
Ao dealbar da manhã
Preparad’o afã,
Que de pronto era eu!

Sentind’o cheiro
Da vida campestre,
Volvia-me a “peste”
De rosto trigueiro!

O rapaz da cidade
Montav’a tenda!?
Sem ponta d’emenda
Ou sanção do “alcaide”!

E viajava, “agreste”,
Por vales e fragas,
Em disputas, refregas
De menino campestre…

Fingia namoros,
Tentava conquistas,
Guiado por pistas
A imaginários tesouros!

Galgava indómito
Os galhos da vida,
Sem sela revestida
Tal qual um “Jerónimo”!

Investindo no lombo
Do nervoso animal
P’lo espaço sideral
De viagem ao tombo…

E caído volvia
A nova montada!
P’lo campo ou estrada,
E de novo caía…

Levantando-me a jeito
Como se nada fosse…
Fugindo ao coice
Do bicho satisfeito!?

E volvia a casa
Da minha avó,
Tão cheio de pó…
E sem quebra d’asa!

E no dia seguinte
Uma nova manhã,
Que no riacho uma rã
Observa já vinte!?

E todos mergulham
Na nudeza da água,
Onde uma onda propaga
O calor donde bulham!

E no jogo da bola
O desafio da disputa,
Numa pequena luta
Disputada à sola!

No caminho de volta
O balido das cabras,
Onde, no sumiço das fragas,
O pastor nem se nota…

Anoitece na aldeia
Nessa noite d’Agosto,
Todo breu o meu rosto
Na conversa ateia…

Um fantasma que vive
No caminho a jusante,
Uma morte errante
P’lo amor que não teve…

Só o oculto me trai
Nesse meu desassombro!
E de pronto m’escondo
Dessa noite que cai…

E avanço a casa
Da Avó que m’espera,
Nessa minha quimera
Ond’o tempo não passa!

Mas já cresço na vida
E me esqueço da aldeia,
Dessa minha epopeia
E infância esquecida…

Surge-me agor’a saudade
Desses tempos de verão,
Recordando o Marão
Na travessia da idade!

E por isso lá volto
Neste meu pensamento
Ao exacto momento
Onde estive por luto…

Nessa última ida
À aldeia do Corgo,
O meu tio jaz morto
Nessa igreja esquecida…

Ao momento inexorável
Da passagem do tempo:
Um corpo sem movimento
Inadiável…

E é essa lembrança
Que m’o faz reviver,
Já depois de crescer
Desde qu’era criança:

A memória é junção
Entr’a vida e a morte,
E um caminho pr’a norte
No calor do Verão…

2014